Glória no Sofrimento de Cristo
A Bíblia glorifica o sofrimento de Cristo. Ela retrata sua dor como o ato decisivo de redenção, o culminar da sabedoria divina e a revelação do plano eterno de Deus. Seu sofrimento foi predeterminado, anunciado pelos profetas e realizado com obediência deliberada. Glorificar o sofrimento de Cristo é reconhecer a cruz como o centro da obra de Deus no mundo, o lugar onde a salvação foi assegurada e a vitória sobre o pecado e a morte foi alcançada. Os apóstolos retornavam a esse tema repetidamente, exaltando não apenas o fato da ressurreição de Cristo, mas a morte pela qual ela havia sido garantida. Seu triunfo sobre a morte tinha significado porque confirmava o poder de seu sofrimento para reconciliar o homem com Deus.
Quando o Novo Testamento fala do sofrimento de Cristo, ele o distingue como diferente de qualquer outro. Sua agonia não era a dor comum dos homens, que pode surgir de doença, acidente ou decadência natural. Seu sofrimento era sacerdotal e judicial, um carregamento da ira divina no lugar de outros. Pedro apontou para as feridas de Cristo como a fonte de cura. Paulo apontou para sua morte como o fundamento da justificação. O escritor de Hebreus mostrou que sua obediência até a morte cumpriu todo o sistema sacrificial. Em todos os casos, as Escrituras glorificam o sofrimento de Cristo porque ele foi o meio ordenado de redenção. Seu sofrimento foi eficaz e vitorioso.
Quando os apóstolos exortavam os crentes a compartilhar dos sofrimentos de Cristo, eles não sugeriam que a dor humana pudesse suplementar a redenção. Eles nunca insinuaram que a aflição carregasse a mesma dignidade que a cruz. Eles falavam, em vez disso, da oposição enfrentada por aqueles que confessavam Cristo, e das provações que surgiam da fidelidade ao seu nome. Paulo escreveu sobre completar o que faltava nas aflições de Cristo. Ele não quis dizer que a cruz estava inacabada. O que resta é que o mundo ainda está perseguindo Cristo, e faz isso perseguindo a sua igreja. Dessa forma, os crentes compartilham dos seus sofrimentos, não adicionando à redenção, mas suportando o ódio que ainda é dirigido a ele.
Esse padrão bíblico é corrompido quando religionistas egocêntricos desviam a atenção de Cristo para si mesmos. Eles se gabam de suas dificuldades pessoais, como se estas tivessem valor espiritual. Suas aflições podem ter surgido da pobreza, de mau julgamento ou dos problemas comuns da vida, mas eles as exibem como se tais coisas os unissem a Cristo. Eles glorificam o próprio sofrimento em vez do sofrimento de Cristo. Ao fazerem isso, confundem as dificuldades pessoais com o sofrimento semelhante ao de Cristo, e corrompem o evangelho ao transferir a glória do Filho de Deus para as feridas dos homens.
O falso é destrutivo de duas maneiras. Primeiro, rouba de Cristo a sua honra única. A cruz torna-se um pano de fundo para o drama humano, e o sofrimento do Filho de Deus é deslocado pelo espetáculo de homens se gabando na dor. Segundo, produz uma fé distorcida na qual a miséria é tratada como se fosse santa. As pessoas imaginam que suas derrotas, falhas ou dificuldades carregam aprovação divina e valor espiritual. Elas buscam na sua dor a validação em vez de em Cristo a salvação. O resultado é um falso evangelho que celebra o desespero e o chama de devoção.
O sofrimento de Cristo nunca foi sem sentido. Foi dirigido por Deus, carregado de poder redentor e coroado com triunfo. O sofrimento humano, a menos que seja suportado por causa do evangelho, não carrega tal caráter. Pode atrair simpatia, mas não glorifica a Deus em si mesmo. Confundir os dois é despojar a cruz de sua distinção e baratear o discipulado. Um crente pode sofrer doença, perda financeira ou luto. Essas experiências são reais, mas não se assemelham em si mesmas ao sofrimento de Cristo. E, na maioria dos casos, são resultados de infidelidade ou tolice. Somente quando a aflição surge da fé na palavra de Deus, da confissão do evangelho e da lealdade a Cristo é que carrega a marca de compartilhar de seus sofrimentos.
O religionista que se gloria em sua dor sem o evangelho demonstra que não aprecia a cruz. Ele trata o sofrimento como se este o santificasse por sua mera ocorrência. Mas a aflição não justifica, e o problema não santifica. Cristo justifica, e o seu Espírito santifica. A dor não tem poder para tornar uma pessoa santa. Somente a perseguição pelo evangelho tem significado, porque revela o ódio do mundo a Cristo e a lealdade do crente a ele. Ensinar o contrário é substituir o evangelho por uma falsificação na qual a miséria se torna o centro da devoção e a fraqueza humana substitui o triunfo divino.
A verdadeira glória do evangelho proclama um sofrimento que realizou a redenção e uma ressurreição que selou a vida eterna. Ele aponta para uma cruz que não pode ser repetida, e convoca os crentes a se gloriarem apenas no que Cristo concluiu. A tarefa do cristão não é exibir suas feridas, mas exaltar aquele que triunfou por meio de feridas. Paulo relatou suas aflições, mas sua glória sempre apontava para longe de si mesmo, para a graça de Deus. Quando ele descrevia sua fraqueza, magnificava o poder de Cristo que o sustentava. Quando ele recordava as perseguições, glorificava o evangelho que avançava por meio delas.
A distinção, então, é entre a glória centrada em Cristo e a glória centrada no homem. A Bíblia glorifica o sofrimento de Cristo porque ele é o centro da salvação. A falsa religião glorifica o sofrimento do homem porque ele é o centro do orgulho. A primeira produz fé, gratidão e perseverança. A segunda produz desespero, hipocrisia e autoexaltação. Preservar essa distinção é essencial para manter o evangelho e expor suas falsificações.
O crente que se gloria no sofrimento de Cristo permanece ao lado dos apóstolos ao declarar que a salvação foi completa e a vitória segura. Ele confessa que nenhuma dor humana poderia adicionar algo à cruz, e que nenhuma dificuldade pessoal carrega mérito espiritual. Ele sabe que as feridas de Cristo foram suficientes, e que suas próprias aflições, se unidas ao evangelho, são ocasiões para honrar a Deus em vez de a si mesmo. Dessa forma, o evangelho permanece em contraste inabalável com toda religião centrada no eu. Ele não deixa espaço para o orgulho humano, nem mesmo no sofrimento, mas dirige toda a glória ao Filho de Deus que sofreu de uma vez por todas e ressuscitou em triunfo.
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